O importante é ler em qualquer mídia, impressa ou digital

Por Ivani Cardoso
A pedagoga, escritora e arte-educadora Nereide Schilaro Santa Rosa aprendeu muito cedo que ler era divertido e libertador. Seu primeiro livro infantojuvenil foi Villa-Lobos, publicado em 1994, pela Editora Callis. A partir daí não parou mais de escrever e hoje tem mais de setenta livros publicados em múltiplas editoras. Nereide acredita que os pais podem incentivar a leitura dos filhos com uma atitude simples: “Lendo, lendo e lendo para seus filhos. A leitura oral para a criança é um momento de carinho, atenção e de amor que ela nunca esquecerá. Incentivar a leitura silenciosa também é importante para que a criança interaja com o texto, e trabalhe com a sua imaginação. Os pais devem trazer livros para casa, demonstrar claramente que valorizam a leitura, frequentar livrarias e compartilhar das escolhas dos títulos, assim como levar as crianças às bibliotecas e demonstrar que ali se guardam livros, pois são objetos importantes para se conhecer literatura e sua história.” Nereide é ganhadora do Prêmio Jabuti de 2004 e vários prêmios da Fundação Nacional do Livro Infantojuvenil com a Láurea Altamente Recomendável. Para ela, o livro impresso sempre existirá: “O contato físico com o objeto livro faz parte de uma interação pessoal entre o texto e o leitor. Mas, além disso, o mais importante é que se leia, seja em qualquer mídia, impressa ou digital.”

Como surgiu a ideia do seu livro sobre Villa-Lobos?
No ano de 1992, como professora e educadora musical, tomei conhecimento da coleção inglesa Crianças Famosas (Famous Children) traduzida pela Callis Editora e voltada para o público infantil. Essa coleção tem como proposta contar sobre a infância de personagens importantes para as artes, para a música e para a sociedade em geral. Isso me levou a propor para a editora a publicação de um título sobre um personagem brasileiro nessa coleção, no caso o compositor Villa-Lobos. A proposta foi aceita e acabou abrindo portas para outros títulos de brasileiros importantes.

Há outros nessa área?
Após Villa-Lobos, publiquei outros títulos na Coleção Crianças Famosas: Monteiro Lobato, Carlos Gomes, Volpi e Santos Dumont. Uma das características mais significativas dessa coleção é contar sobre a infância de pessoas que se tornaram importantes para a sociedade, aproximando-as do pequeno leitor, que pode se identificar com as brincadeiras, com as curiosidades e com as dificuldades que todos, de alguma forma, enfrentam.

Quais as características importantes de um bom livro infantil?
O bom livro infantil tem que encantar o leitor. Deve ter linguagem adequada, que respeite o conhecimento da criança e o seu desenvolvimento cognitivo, visto que é fundamental manter o interesse do leitor, além da escolha do tema e das ilustrações. O livro infantil deve ter o mesmo cuidado editorial de qualquer outra publicação.

O que acha da literatura infantil e juvenil brasileira?
Gosto muito. Os autores e as autoras são extremamente comprometidos com seu público, e há uma diversidade de ofertas, desde os ficcionais até os informativos. É muito importante formarmos leitores, aumentarmos a quantidade de títulos brasileiros, e os autores se aproximarem do universo infantojuvenil, propiciando uma literatura viva, abrangente e crítica.

A senhora já recebeu vários prêmios? No mundo literário, as premiações rendem maiores vendas?
Recebi o Prêmio Jabuti em 2004, como autora do melhor livro paradidático daquele ano, além de ter recebido diversos prêmios com a láurea de Altamente Recomendável pela Fundação Nacional do Livro Infantojuvenil. Sinto-me honrada em ter recebido esses prêmios, e os considero como formas de reconhecimento de meu trabalho. Pessoalmente se tornaram fatores de motivação para novos desafios e me incentivaram a continuar escrevendo. Sobre vendas, acredito que os prêmios são indicadores criteriosos de qualidade literária e podem incentivar o leitor a conhecer e, talvez, adquirir obras premiadas.

A senhora acha que os professores estão preparados para incentivar a leitura?
Quando dava aula, incentivava meus alunos a ler e a frequentar as bibliotecas públicas. Na rede municipal onde atuava, existiam as salas de leitura com professores especialistas em literatura. A leitura na escola é fundamental, e é a base para a boa redação e para a compreensão de textos. O professor sabe disso e naturalmente possibilita o acesso do aluno à boa leitura. No entanto, é importante que esse professor se mantenha atualizado e leia constantemente, pois na educação não podemos parar de estudar.

Quais são os maiores desafios para a formação dos leitores no Brasil?
Aumentar a quantidade de bibliotecas, incentivar e motivar os leitores com livros de excelente qualidade literária, priorizar temas interessantes para o público leitor, incentivar a publicação de autores brasileiros e sermos criteriosos na escolha de títulos.

Escrever para crianças e jovens em um mundo onde a tecnologia invade todos os cantos não é difícil? Como despertar o interesse pelo livro impresso?
O livro digital é uma realidade em muitos países. Trata-se de uma democratização da literatura. No entanto, no Brasil, ainda é acessível a uma parcela mínima da população. Considero inevitável, num futuro próximo, que esse acesso aumente e se torne mais presente na vida dos leitores. Mesmo assim, acredito que o livro impresso sempre existirá, pois o contato físico com o objeto livro faz parte de uma interação pessoal entre o texto e o leitor. Mas, além disso, o mais importante é que se leia, seja em qualquer mídia, impressa ou digital.

Como escolhe seus temas? De onde vem a inspiração?
Meus temas preferidos tratam de arte, cultura e música, mesmo quando escrevo obras ficcionais. Muitas vezes acho interessante misturar o informativo com a ficção. Gosto de escrever biografias, pois aprendo com a pesquisa e acredito que o texto biográfico possa ajudar o leitor a entender como são as pessoas, como elas vivem, e cumprem um papel na sociedade. A minha inspiração vem do tema escolhido e do desafio em escrevê-lo. Cada livro é especial, tem sua história, meu momento de vida, uma parte de meu ser. Cada novo livro é uma nova conquista, que se torna uma etapa vencida, que me faz ir além.

Quando começou a se interessar pelos livros? Quem mais incentivou? Quem eram seus autores preferidos na infância?
Na minha família, a leitura sempre esteve presente. Quando criança, minha mãe me levava à biblioteca do nosso bairro semanalmente e eu trazia livros com o compromisso de ter um tempo determinado para ler e devolvê-los. Meu pai fazia questão de me presentear com livros e minha irmã mais velha era, e ainda é, leitora assídua, o que contribuía mais ainda para despertar esse mundo da leitura. Aprendi que ler era divertido e libertador. O meu autor preferido na infância foi Monteiro Lobato: suas histórias me encantavam e faziam a minha imaginação fluir. Quando lia as suas obras infantis, eu me transportava para o mundo do Picapau Amarelo. Décadas depois, tive a emoção de escrever dois livros sobre sua biografia.

E na adolescência?
Na adolescência, o gosto pela leitura continuou presente. Lia os clássicos da literatura brasileira e portuguesa, mesmo com pouco tempo disponível, pois estudava música junto com a educação básica e, aos dezesseis anos, comecei a trabalhar e entrei para a faculdade. Nesse período, as obras de Machado de Assis eram as minhas preferidas. Mais tarde, as biografias de grandes mestres da música e das artes visuais se tornaram leitura constante, além dos livros acadêmicos. Comecei a escrever bem cedo, e durante a faculdade publiquei dois livros didáticos sobre música direcionados para cursos de formação de professores.

Quais são os problemas na formação dos professores?
Por muito tempo fui professora de artes em cursos de formação de professores e sei que um dos problemas é a falta de tempo do futuro professor para fazer pesquisas mais aprofundadas, participar de debates para desenvolver cada vez mais o seu senso crítico e a reflexão sobre o que é educar e o que é aprender. As necessidades da vida, como trabalho e o seu sustento, muitas vezes acabam exigindo do aluno, futuro professor, uma atenção maior. Especificamente sobre a formação de professores de artes, há que se valorizar a sua importância pedagógica no curso de formação dos professores, como mais um campo de desenvolvimento do conhecimento humano e oportunizar a formação sobre educação musical e artes visuais.

Os clássicos continuam sendo importantes na formação?
Sem dúvida. A literatura clássica é fundamental para a construção do conhecimento. O escritor existe a partir do que ele leu, ou lê, e do repertório que foi adquirido ao longo do tempo. Conhecer diferentes formas de escrita, gêneros e estilos literários, contribui de forma significativa para o pensamento divergente e a formação cognitiva de cada indivíduo.

NOTÍCIA ORIGINAL: O importante é ler em qualquer mídia, impressa ou digital – Contec  Brasil –  Ivani Cardoso – 2/4/2015
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